quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

As musas e a contemporaneidade





















Desde a Antiguidade Clássica - e por que nao incluir os tempos remotos em que não havia registros linguísticos, mas apenas desenhos - a arte e a preocupação estética mostraram-se sempre presentes, desafiando o intelecto humano, atuando assim, como ponto de contato entre os mortais, inspirados de conteúdo poético, e os deuses.

Naquela época, contudo, as musas das artes abençoavam seus seguidores com bálsamos de criatividade e engenho cuja utilidade era inserir poesia em formas como um vinho preenche um cântaro.

Teatro, dança, música, escultura e tantas outras formas tradicionais de arte possuiam certas características e técnicas, variando, algumas vezes, em certos pontos específicos que o gênero permitia, como bem descreveu Gombrich em seus diversos compendios sobre história da arte.

Porém, o homem variou mais do que os gêneros e as técnicas. Infelizmente, devido à superpopulação do mundo, às duas hecatombes mundiais, à luta de classes sobre a qual Marx esmiuçou e o surgimentos de novas tecnologias - e, portanto, novas técnicas - cunharam novos limites que os antigos padrões clássicos de arte não abrangiam: as musas gregas ganharam, por fim, novas amigas, cibernéticas, urbanas e, algumas vezes, pitorescas.

As vanguardas européias, como sugerem os manuais de literatura e história da arte, por exemplo, reiventaram as antigas artes. O expressionismo alemão cujo maios expoente é Kirchner ou o impressionismo frances de Monet evidenciaram uma sensibilidade - fruto da variação humana - que nada tinham a ver com os padrões estéticos greco-romanos. As fronteiras da arte foram, pois, maculadas: o ponto de contato com os deuses foi rompido e, sem surpresa, o mundo tornou-se gradativa e orgulhosamente ateu.

Na modernidade atualmente instituída, estupram-se as musas: no mundo pós-vanguardas, grafitismo, twitter, sms, QR code, enfim, tecnologias antes inexistentes, implodem os limites e as fronteiras do que seria considerado arte permitindo que a tal técnica se especialize - ou não - de modo a conter, em um conceito de arte, tanto o escultor clássico como Michelângelo, o grafitismo dos irmãos Pandolfo e a construção de castelos com palitos de dentes usados (a favor da sustentabilidade do mundo) de anônimos ambiciosos de serem reconhecidos como artistas de sucesso, como postula uma mídia tendenciosa, uma ciência psicológica equivocada, uma pedagogia marxisista notadamente frustrada, e a fama instantânea tão em voga devido aos inúmeros reality shows.

Os limites e as fronteiras da arte tornaram-se, portanto, fugidias, evanescentes, fluídas e falaciosas. O diáfano e ludibrioso conceito de arte, hoje, abarca todo tipo de hobby, técnica, suporte midiático, ou estupidez de que o engenho humano é capaz. As musas, por fim, vandalizadas, sentam-se em divãs psiquiátricos: suas almas estão tão vazias quanto a própria arte.