Guimarães Rosa demonstra uma preocupação muito grande quanto a seus personagens. Percebe-se claramente tal cuidado ao observarmos o empenho com que o autor escolhe os nomes e os trabalha ao longo de sua obra.
Entretanto, esse jogo torna-se sério quando o nome da personagem é construído para refletir sua personalidade embora ao contrário do que se pode pensar, isso não tipifica suas personagens uma vez que cada uma possui um valor dentro da obra único e ainda é passível de diversos significados como ocorre com a protagonista de ‘O recado do morro’.
Pedro Orósio é uma personagem que seria traída e morta se o recado na chegasse a ele musicado por Laudelim. Seu nome é significativo e polissêmico.. Observe que Pedro descende de pedra, rocha e, curiosamente, é esta sua função na narrativa: ser o alicerce do Bem. Ainda se tem Orós dentro de seu sobre nome Orósio que significa montanha e que demonstra alguma ligação transreal como o monte emissor do recado, dando indícios importantes da personalidade de Pedro, mas nunca limitando sua personalidade.
Quando se aplica esses conceitos no conto “Hora e a vez de Augusto Matraga” percebe-se que a ligação é ainda mais intrínseca e complicada do que aparenta.
Ocorre que, ao longo da narrativa, o protagonista muda de espaço e de estados de espírito e seu nome percorre também estas mudanças.
Curioso reparar que são três nomes que abarcam três condições espirituais e que dá certa religiosidade à obra, assemelhando-se aos padrões de conversão de persnoagens bíblicos.
Quando “Hora e Vez de Augusto Matraga” se inicia, a personalidade da protagonista é violenta; vivia à volta com prostitutas, jogos, adultério e nesta condição, que Ferri chama de infernal, ele é conhecido como Augusto Esteves. Coronel Augusto Esteves.
Nesta fase, ele é temido por seu temperamento agressivo, entretanto, Augusto não percebe que não é mais tão onipotente uma vez que suas posses minguaram e deveria ter mais cuidado já que tem muitos inimigos.
Segundo o enredo da obra, Augusto fica sabendo que sua esposa Dinorá fugiu com Ovídio e, antes de ir atrás dela, pretende acerta suas diferenças como o major Consilva; entretanto, Augusto não tem mais capangas e acaba por apanhar dos serviçais do major, é marcado a ferro e pula do precipício que havia por perto. É tido por morto.
Entretanto, Augusto se aproxima de sua fase de purgatório. Ele ainda vive, Esta debilitado, é verdade, mas é acolhido por um casal de negros que tratam das crises de alucinação (estas simbolizam a briga com a própria morte no inferno).
Augusto então se recupera e então na obra seu nome muda para Nhô Augusto, iniciando sua fase de purgação. Esta fase está ligada a um outro espaço diferente do primeiro.
O primeiro espaço (o de Augusto Esteves) é o município do Murici.
O segundo (o de Nhô Augusto) é o vale do Tombador em que se ocupa dos afazeres da penitência da carne, segundo os padrões cristãos católicos. Esse espaço é uma configuração do seu estado de espírito. “é um lugarejo afastado,” como diz Ferri, “propício à reflexão”.
Nesta fase/lugar, Nhô Augusto é tentado a voltar à sua antiga vida com a presença de Joazinho Bem-Bem. Sua vida, entretanto, permanece no caminho do Bem e do Próximo. Note que Joazinho Bem-Bem é um cangaceiro e portanto mau, mas seu nome não evidencia isso, aliás, muito pelo contrário, o nome significa exatamente o oposto do que a personagem é.
Quando esta fase acaba, Nhô Augusto abandona o Tombador ao se sentir lavado pela chuva (os marcos naturais são muito freqüentes para se marcar transição de períodos em toda a obra rosiana) e ao ver um bando de maritacas migrando.
Quando Nhô Augusto morre, ele atinge a sua redenção abandonando seu corpo porque, estando pronto e no caminho do Bem, pôde partir. Nhô Augusto cede espaço para Matraga e então ele sobe aos Céus.
A temática religiosa é também de grande importância. Esta saga, contada de forma linear, reproduz as principais características das personagens bíblicas como a estigmatização de um mártir (Augusto é marcado com ferro antes de pula ao precipício) e sofre sucessivas tentações (como Cristo também sofre).
Como se pode perceber, o valor dos nomes em “Hora e Vez de Augusto Matraga” é de grande valia. Galvão atenta para a significação do nome e percebe-se a veracidade de sua afirmação já que Nhô Augusto é, de fato, seu nome como indivíduo civil; Augusto Esteves é seu nome na antiga cidade em que vivia e Matraga é seu nome mítico – de santo – já que é a própria concretização de sua redenção.