terça-feira, 2 de novembro de 2010

Odisseia de ninguéns


Odisseu, em sua Odisséia de retorno à Itaca, sua cidade de origem, teve necessidade, em terras de Ciclope, de mudar seu nome para “ninguém” a fim de manter-se vivo em nome de seu amor à rainha Penélope. Mesmo sendo Perseu o protagonista, Homero, no seu personagem, não deixou de reconhecer que, em cada líder, há algo de popular, anônimo e trabalhador.

Porém, o caso de Odisseu é uma exceção. O povo brasileiro – e até mesmo do mundo todo – encontra-se, hoje, sob a égide de ser ninguém: são anônimos que sustentam toda a cadeia de serviços, produtos, eventos, motins, levantes e revoluções em nome de um líder – seja político, público ou de grandes empresas a serviço do capital privado – que vêem, sob o estandarte de um objetivo ou bem maior, seu nome esvair-se por entre a profusão de louvor aos grandes.

Em sua rotina diária, massacrante e, por vezes, insalubre e insuportável, vítimas, por outras vezes, de preconceito (como ocorre desde o nordestino em São Paulo ao brasileiro em Londres) destinam sua vida a compor a maquinaria burocrática, o aparato judicial, o sistema político, o quadro de funcionários em ‘fast-foods’, para, por fim, serem vítimas da burocracia, do judiciário, da política...enfim, de tudo aquilo que sustentam, recompensados minimamente por salários que não reconhecem o esforco que fazem tampouco sua importância: são poucos os que conseguiriam viver sem o cabeleireiro peruano ou sem o coletor de lixo baiano ou pernambucano.

Por outro lado, tampouco os grandes líderes, que tomam cada indivíduo a objetivo comum (seja público ou contratual) serão eternos. A História oferece, sistematicamente, ao sabor da saitsfação popular, exemplos claros de que líderes que abusaram de seu poder ou subestimaram o povo deixaram à força suas posições quando não foram destinados ao ostracismo até que a própria História encarregar-se de torná-los anônimos novamente.

Ser ninguém ou alguém não é, como alguns defendem, relativos. Todos são ninguéns, porém, sincronicamente, a impressão de eternidade dada a certas figuras carismáticas serão apagadas, uma vez que o tempo é infinito, a História inconclusa e o homem mortal.

Afinal, todos retornam ao pó de que biblicamente vieram, Líderes entrarão e tombarão, contudo, a força anônima, motriz social, persistirá, nunca, é verdade, nomeada ou reconhecida, todavia, constante, gradual e contínua, assim como quis Odisseu ao utilizar seus argonautas para seu fim egoísta e mesquinho.


3 comentários:

Marina Silva e Siqueira disse...

morrer de estudar para passar numa faculdade ter um emprego razoável e, ... ser ninguém.
inspirador, Daniel.

Bruna Luque Maia disse...

Daniel seus textos são bem legais, embora um pouco complexo para mim.
:D

Marina Silva e Siqueira disse...

[exclui depois]
ô daniel, qual era o nome daquele livro que você tinha me recomendado? (tinha algo a ver com 'um mundo melhor')